O POLÊMICO ALMIRANTE COCHRANE

 

 

CMG Ref José Alberto Cunha Couto  

 

Carioca, passei minhas infância e adolescência atravessando a rua Almirante Cochrane, na Tijuca.

Alguns anos mais tarde, ao ingressar na Marinha, conheci, nas aulas de História Naval, o Almirante Cochrane pelos seus feitos ao ser contratado para organizar a nossa, então, Marinha de Guerra, para pacificar rebeliões contra a independência do Brasil.

A guerra da independência foi longa e desgastante. Durou 21 meses.

O isolamento e interesses das províncias do Norte, Nordeste e Cisplatina, que continuavam leais a Portugal, prenunciavam divisão do território, a exemplo do que já ocorria nas vizinhas colônias espanholas.

Para fazer frente a essas rebeliões, D. Pedro I não tinha condições de organizar um exército que pudesse atuar em todo o vasto território nacional.

Foi quando se fez necessária a ação da Marinha para evitar a fragmentação do país.

Nosso imperador recorreu, então, ao auxílio financeiro da Inglaterra e contratou os serviços de mercenários ingleses que tiveram importante papel nesses conflitos.

O novo governo sabia que, em um território com mais de 8.000 quilômetros de litoral, além de precisar de um número maior de navios, enfrentava uma dificuldade adicional: lhe faltavam oficiais e marinheiros.

Sem tempo, dinheiro e condições de construir navios, bem como treinar e recrutar homens, a solução foi procurar reforços na Europa.

É quando surge a contratação do Almirante Thomas Cochrane para a até então desorganizada Marinha de Guerra brasileira.

Convidado por indicação de José Bonifácio, o escocês havia se destacado na guerra do Pacífico, que resultara na independência do Chile.

Com a proposta de manter seus vencimentos e título de Almirante iguais ao que ocupava no Chile e ainda ser merecedor de todas as presas de guerra que pudessem ser capturadas (navios portugueses, suas cargas, e qualquer outra propriedade portuguesa) o Lorde escocês assumiu como o Primeiro Almirante do Brasil a 21 de março de 1823 e partiu do Rio de Janeiro a três de abril, navegando a vela para a Bahia.

Atuando no Norte, no Nordeste e na Confederação do Equador, Cochrane obteve, em todas, a rendição das forças portuguesas, incorporando essas regiões ao novo país independente.

Assim sendo, vê-se que Lorde Cochrane foi importante ao Império brasileiro para a consolidação do território como ele é ainda hoje.

Nos trinta anos seguintes, Cochrane tentou judicialmente obter suas indenizações por presas de guerra (mais de 140 navios, rendas de alfândegas e propriedades de portugueses de províncias), as quais lhe foram sempre negadas sob a alegação de que a maior parte havia sido tomada de forma ilegal e contra as leis de presa.

Essa questão só foi resolvida após a morte de Cochrane, com D. Pedro II pagando com juros a dívida brasileira referente a soldos e a presas de guerra.

Eis que, recentemente, foi lançado o livro Lord Thomas Cochrane, de George Ermakoff (editora G. Ermakoff), e nele a história fica mais clara: Cochrane por vezes é herói, por vezes vilão.

Como Deputado, em 1806, Cochrane atacou o tratamento vil como o Almirantado Real tratava comandantes e marinheiros, que o escocês via como heróis.

Em 1814 se viu envolvido em fraude da Bolsa de Valores de Londres, participando de boato sobre a morte de Napoleão. Condenado, foi preso e perdeu seus títulos.

Depois partiu para as muitas incursões marítimas, atraído pela oportunidade de conseguir acumular riqueza com as presas de guerra.

De origem aristocrática, Lord Cochrane serviu à Marinha Britânica enfrentando as esquadras francesa e espanhola.

Ao longo de sua vida, ele capitaneou marinhas em lutas pela independência de quatro nações: Chile, Peru, Brasil e Grécia.

Cochrane voltou para o Reino Unido em 1825, porém logo foi contatado pela Grécia, que também tentava alcançar sua independência.

Ele renunciou a seu posto de Almirante após fracassar na Batalha de Falero, em que foi empregado o 1º navio de guerra a vapor, e voltou para o Reino Unido, onde recebeu o perdão do rei Guilherme IV e retornou à Marinha Real como Contra-Almirante naquela força.

Cochrane herdou, então, o título de Conde de Dundonald e passou a concentrar seu tempo em pesquisas científicas para aplicação marítima.

Morreu aos 84 anos de idade, durante uma cirurgia de cálculo renal.

Enfim, por toda sua história, apelidado de lobo do mar e cantado em poema de Pablo Neruda por seu errante destino de Almirante libertador dos povos, entendo que Lorde Thomas Cochrane merece, sim, ser lembrado neste ano de 2022 em que se comemora o bicentenário de nossa independência.

 

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